A revolução não será televisionada, mas para eles, pouco importa, para isso tem o YouTube. Kéfera Buchmann, Jout Jout, Chris Figueiredo, Isabela Freitas,Felipe Neto: esses são alguns dos nomes que comandam um movimento no site de vídeos do Google junto a um público fervoroso por conteúdo original e com personalidade.
A Generation C – conceito criado há alguns anos para uma geração não definida pela idade, mas pelo comportamento – é a geração dos youtubers e dos creators(termo usado nos Estados Unidos para designar qualquer um que produz conteúdo na internet). Eles valorizam a conectividade, o pertencimento à comunidades e a criação de conteúdo e redefinem o conceito de cultura mainstream.
É esse gigantesco grupo composto principalmente pelos millenials, os nascidos entre a década de 1980 e 2000, que dita o que é tendência nas redes sociais, instiga o mercado publicitário e quer cada vez mais ter sua voz ouvida. E alguns deles não são apenas ouvidos, mas venerados por milhões que lotam bienais, estádios, livrarias e teatros. Cada um mostra o que tem de melhor para conquistar seu público e os contratos comerciais com vídeos no YouTube.
Segundo o Google, o site atinge mais adultos de 18 a 49 anos que qualquer rede a cabo nos EUA. A revista americana Variety perguntou a jovens americanos de 13 a 18 anos quais eram as figuras mais influentes dos Estados Unidos. Os primeiros cinco são estrelas do YouTube, que ficaram na frente até mesmo de atrizes de Hollywood como Jennifer Lawrence e a cantora Katy Perry.
No Brasil, um dos veteranos nessa área é PC Siqueira, criador de um canal com mais de 1,8 milhão de inscritos, o Maspoxavida. Hoje, ele é considerado uma das personalidades mais influentes da internet e colhe os louros da fama, seja em dólares ou reais.
Ele é irônico, já teve seu próprio programa na MTV brasileira e consegue falar em frente às câmeras sem perder o fio da meada por dezenas de minutos, pulando de assunto em assunto. Nos eventos de cultura de internet, ele é assediado por jovens que se debatem por uma selfie ao lado dele.
PC começou em 2010, o mesmo ano em que o carioca Felipe Neto, 27 anos, viralizou com seu canal Não Faz Sentido, em que metralhava críticas a diversos temas. O mais assistido até hoje, com 14 milhões de visualizações, e um dos primeiros a serem publicados foi sobre a saga adolescente Crepúsculo.
Com ironia, Neto analisou todos os aspectos do filme, que, como o canal indica, não fariam sentido nenhum sentido para ele. Ele foi de “um cara que gravava vídeos em casa”, para CEO de uma empresa de consultoria para canais no YouTube, que depois foi vendida para uma multinacional de entretenimento digital.
Cinco minutos que renderam milhões
Lançar um canal e em alguns meses ganhar notoriedade de artista pop foi o destino de tantos outros youtubers brasileiros. Comparar, por exemplo, Kéfera Buchmann a uma celebridade americana não é nem exagero. Em números, a curitibana dá um banho até em Britney Spears. A brasileira tem mais de 6 milhões de inscritos no YouTube, o 5incominutos. O canal oficial de Britney tem 3,2 milhões.
Kéfera Buchmann é hoje a mulher mais influente da internet segundo o público adolescente. Keh, como é conhecida pelos fãs, começou o canal 5incominutos aos 17 anos. Depois de terminar o Ensino Médio, confusa sobre o futuro, ela tinha o sonho de trabalhar como atriz. Gravou o primeiro vídeo para ganhar visibilidade no meio artístico, falando sobre sua irritação com as vuvuzelas da Copa do Mundo.
Desde então, ela vem acumulando fãs, na maior parte adolescentes fanáticas, com os seus vídeos sobre os mais variados temas, usando muitos palavrões e de um jeito único, teatral e sem medo de se expor. Bagunça, dietas que não dão certo, flertes ruins, beijo lésbico, TPM e banheiro público figuram na lista de coisas que a curitibana aborda nas gravações.
Às vezes, ela traz a própria mãe para frente das câmeras. O sucesso da atriz e youtuber é tanto que o universo Kéfera inclui loja online com produtos exclusivos. Em setembro, lançou o livro Muito Mais que Cinco Minutos, em que conta sua história de vida, e revela sobre o bullying que sofria na adolescência.
Seu canal é o quarto maior do Brasil, ficando atrás do famoso Porta dos Fundos, com 10 milhões de inscritos, que aposta em produções elaboradas e atores consagrados como Fábio Porchat. E, na carona do sucesso da youtuber, até os próprios fãs se tornam webcelebridades. Karoline de Oliveira, 26, de Porto Alegre, trabalha como fotógrafa e cuida de um perfil no Twitter, página no Facebook com mais de 1,4 milhões de curtidas e um canal do YouTube sobre a própria Kéfera, que são sucesso por si só.
Ela se tornou a referência em “cultura Kéfera”, fazendo uma curadoria sobre a youtuber para os outros fãs com memes e montagens que levam as melhores frases ditas pela ídola. Karoline já recebeu o reconhecimento do próprio Google com uma placa de prata por atingir cem mil inscritos no canal Frases da Kéfera.
O sonho de "viver de internet"
Um dia após o lançamento do primeiro livro, Tá, e Daí?! A Vida por mim, na semana passada, a gaúcha Ana de Cesaro, 27 anos, diz que ainda está surpresa com o público que apareceu para a sessão de autógrafos em uma livraria paulistana:
– Tinha umas 200 pessoas. Não esperava esse monte de gente, estava insegura. O livro foi a primeira coisa que fiz planejando para dar certo. O resto tudo foi acontecendo por acaso.
Desde 2010, Ana transformou sua vida em um reality show estrelado, produzido e editado por ela mesma. A mudança para São Paulo, em 2012, os 40 quilos perdidos e as reformas feitas em casa: tudo está no YouTube.
– É que nem o filme Show de Truman – comenta.
Entre os principais sonhos, um deles era viver de internet. Conseguiu. Hoje trabalha com marcas locais e faz consultorias de mídias sociais. Para chegar aos 10 milhões de visualizações e 117 mil inscritos, a gaúcha de Passo Fundo, que largou a faculdade de música e foi proprietária de uma escola de artes marciais, já gravou sobre as experiências na Europa, sobre o projeto de vida saudável denominado de Ana Gostosa e brada sobre feminismo.
– O feminismo salvou minha vida, me fez sair de um relacionamento abusivo. Então, quero fazer isso por outras pessoas. Não quero empoderar somente a mulher – afirma.
Nas ruas de Porto Alegre, ela encontra fãs. Mas nada de puxão de cabelo ou histeria, eles querem compartilhar com ela histórias de vida.
– Por isso, quero fazer palestras motivacionais pelo Brasil e publicar outros livros, esteja eu na TV ou no YouTube.
De gente comum a estrategistas
A iniciação do brasileiro às redes sociais e à expressão na internet começou com o Orkut, diz Bia Granja, a guru de cultura de internet no país e fundadora do Youpix. Segundo ela, a internet deu voz para as pessoas. Com os vídeos, quem buscava expor sua opinião ou mostrar seu talento ganhava um rosto e a oportunidade de ditar as regras. E quem estivesse interessado, com uma busca rápida, encontrava o conteúdo, seja sobre culinária, moda, maquiagem ou videogames.
– São pessoas reais. Eles falam o que pensam. Por serem tão verdadeiros e autênticos acabam criando comunidades em torno do trabalho deles. Esse engajamento e essa comunidade é a coisa mais poderosa que tem – aponta Bia.
Com a formação dessas comunidades, tudo começou a crescer. As produções em torno dos vídeos ficaram maiores e o feedback instantâneo dos fãs motivava a criar mais conteúdos originais.
– Quem era pequeno ficou até maior do que algumas instituições que antes ditavam as regras. O que aconteceu foi uma revolução comportamental e criativa em grande escala. O YouTube representa hoje o que a TV a cabo foi para a TV aberta algum dia – diz.
Para Manuela Villela, gerente de parcerias do YouTube, o site olha com atenção aos seus criadores de conteúdo, principalmente, para ajuda-los a monetizar seus vídeos e canais e já anuncia que nos Estados Unidos, o site já está trabalhando em produções independentes.
– A forma como lidamos com entretenimento mudou muito nos últimos anos. Hoje, não estamos mais satisfeitos em apenas consumir conteúdos, queremos interagir, opinar, dizer se gostamos ou não. O fã de um youtuber faz parte de uma comunidade que tem um contato direto com o seu ídolo – opina.
Youtuber é de fato uma profissão concorda Manuela. E a maneira que esses profissionais ganham o pão de cada dia é possível pelo próprio programa de parcerias, qualquer canal pode ser um parceiro, independente de tamanho. Além disso, com a fama, vem a procura das marcas, além do lançamento dos próprios produtos.
Segundo o site especializado no mercado editorial PublishNews, dos sete livros mais vendidos até agora em 2015, três são de estrelas do YouTube. No ranking, está "Eu fico loko" de Christian Figueiredo, de 21 anos, que compartilha o seu dia a dia e as angustias e experiências que a maioria dos adolescentes podem se identificar. Ele tem dois canais que somam mais de 4,7 milhões de inscritos. A youtuber Isabela Freitas com o livro "Não se apega, não" também figura na lista. A tendência de lançamento de livros e produtos atende a demanda de fãs que querem consumir o que tem a cara dos próprios ídolos. A receita de publicidade dividida entre o autor dos vídeos e o Google é apenas uma fatia do faturamento dessas novas celebridades.
– As marcas conseguem entrar em contato com um público já cativo e disposto a receber aquela mensagem. O fã está mais sujeito a ser impactado dessa forma direta, porém mais natural, como se estivesse ouvindo a mensagem da boca de um amigo. E as marcas já acordaram para esse fato – explica.
Otávio Albuquerque, 33 anos, conhecido como Tavião, é a dupla de PC Siqueira no canal Rolê Gourmet. Enquanto bebem cerveja e conversam, ensinam receitas como o “dogão de miojo”. Em paralelo, ele mantém um canal que registra coisas que fez pela primeira vez, o Coisas Que Nunca Vivi (ou evitava viver). Formado em Ciências Sociais, hoje é estrategista de conteúdo em um espaço especial para a produção de conteúdo para criadores parceiros do site.
– O YouTube é um lugar da personalidade, diferente de TV e de filmes. Acho que quando a gente é jovem, precisa de modelos para se identificar, e é muito mais eficiente buscar exemplos em pessoas reais, do que uma banda ou ator, que podem ser personagens. O Rolê Gourmet mostra dois amigos bebendo e cozinhando, sendo tontos às vezes, errando. Tudo isso faz parte do programa – diz.
Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/noticia/2015/10/quem-sao-os-youtubers-brasileiros-vistos-por-milhoes-4891400.html
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